A terra queima (1984)
De 1979 a 1985 o Nordeste brasileiro viveu uma das suas mais severas estiagens. O “Milgare Econômico” propagado pelos militares não evitou a morte de milhões de pessoas. Os cem anos de “obras contra a seca” não evitaram os enterros de crianças por fome e sede. É neste contexto, pouco antes do General Figueiredo deixar o Governo pela porta dos fundos – que Geraldo Sarno e Hebert de Souza – o Betinho – escrevem o argumento do documentário A terra queima. As teses, que fundamental o documentário estão no artigo “Uma questão nacional” publicado por Betinho na primeira edição da Revista Lua Nova, no mesmo ano do filme. Os primeiros parágrafos do artigo acompanha o filme em várias aparições na internet, sendo às vezes citados como sua sinopse:
O Nordeste é uma questão nacional em muitos sentidos e de diferentes formas. Primeiro, foi produzido ao longo de nossas história econômica e política: não foi o clima que produziu o Nordeste como problema, mas os senhores donos da terra, homens concretos, de carne e osso, no chão e não nas nuvens. Nenhuma fatalidade obrigou o Nordeste a trabalhar a cana-de-açúcar sob regime escravo, a plantar o algodão explorando o trabalho das mulheres e das crianças nas grandes propriedades, a criar gado em lugar de gente nos imensos latifúndios. Foram os senhores donos da terra que para cá vieram e aqui ficaram. O fato de não chover não produz miséria, assim como o fato de chover não produz riqueza automaticamente. Quem produz riqueza e miséria são os homens concretos e, principalmente, as relações que os homens estabelecem entre si.
Guiado por estas ideias vemos algo além da terra seca e corpos esqueléticos. Há um poder poder popular se concentrando e intensificando em mutirões, manifestações, romarias e retomadas de terra. Os Pankararés – mesmo depois de massacres e do assassinato do cacique Ângelo – estão retomando suas terras e rituais. A resistência negra está viva com sua música e cirando no meio de uma manifestação sindical em Afogados da Ingazeira (PE). Os realizadores viajam ainda por Monte Santo (BA) e Campina Grande (PB). No caminho conversam com camponeses e migrantes de vários lugares, como uma família que fazia o caminho à pé de Mossoró (RN) para Juazeiro do Norte (CE). As cenas em Fortaleza (CE), iniciam-se na estação conversando com famílias que chegam em busca de uma solução na cidade e terminam junto à camponeses nas ruas, vivendo como pedintes.
Segundo Felipe Corrêa Bonfim, a produção foi financiada pela ONU, junto à outros 9 filmes em diferentes continentes. Uma das exigências era o tempo de 5o minutos, para ser distribuído em televisões. (saiba mais em Os documentários de Geraldo Sarno (1974-1987) : sertão, poesia e religiosidade).
É importante refletir sobre o diálogo entre este filme e outros produzidos 20 anos depois pela Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA).
Companhia(s) produtora(s): Saruê Filmes
Produção executiva: Carlos Del Pino, Heloisa Rios e Manfredo Caldas
Argumento: Geraldo Sarno e Hebert de Souza
Direção: Geraldo Sarno
Direção de fotografia: Pedro Farkas e José Antonio Ventura
Eletricista: Arnol Conceição
Som direto: Carlos Del Pino e Dudu Ferreira
Mixagem: Carlos de La Riva
Efeitos especiais de som: Antonio Cezar
Assistente de som: Marcu Almeida
Montagem: Walter Goulart Walter e Severino Dada.
Arranjos musicais: Mario Francisco
Música original: Francisco Mario;
Instrumentista: Henrique Drach, Bruno, Djalma Correa e Zeca Assunção.
Narração: Francisco Milani.